19.3.08

às vezes meu coração inflado fica vazio e me atormenta o vento frio que sai da minha boca e me atormentam os lamentos e me aborrecem me aborrecem todos e às vezes meu coração aborrecido se esquece e se anula e se sufoca. mas não há dor só há o vento e os calafrios e nesse vácuo eu me encontro só e não espero. só. permaneço. às vezes amo noutras esqueço e passo. mas não continuo porque a continuidade é da esperança e eu sou do pacífico indiferente, da respiração pausada, sou dos não-lugares, não tenho ciúme, não sinto as horas. às vezes meu coração pendurado lacrimeja, tem vezes que ele sofre, tem vezes que ele se importa. quando existe o vermelho e os tons de azul já derreteram e aqueles planetas quentes retornam e entorpecem eu me permito. eu inflamo e derreto e viajo e parto e provoco. existem essas vezes, existem matizes rubras nas minhas bochechas e tempestades nos meus olhos, sóis e enxames de abelhas e gatos ronronando enlouquecidos nas minhas pernas. daí a solidão me busca e me empurra ao abismo de tantos quereres e eu me sufoco de prazeres que sempre me fugiram e me afogo em fogos de artifício e óleos com cheiro de tangerina e sinto sabores nos pés e nas pontas dos dedos das mãos. e o coração que era cheio de não-reações tem febre e machuca. mas a dor é boa, é a dor da proximidade da morte e ela tem mãos quentes e um corpo macio e inquieta e entorpece e tudo eu dói e grita baixinho e sussurra palavras desconhecidas, canções pornográficas, gargalhadas ébrias, enquanto tudo é vinho e sonho e me roubam aqueles presentes antigos guardados na parte de cima do armário, aqueles doces que guardei pra depois, os poemas anulados pela vênus em virgem, as quadraturas. me roubam as roupas e os brinquedos, saqueia de mim o pouco, carrega esse hálito cínico e o hábito inútil de escovar os cabelos antes de deitar.

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