8.11.08

[ cap 2 ]

pensei 2 ou 3 vezes que talvez fosse melhor tomar um frontal antes de pegar o metrô. decidi que levaria a cartela pra caso mudasse de idéia no meio do caminho, ou quisesse me matar na volta. 'muito sadio, sabrina.', pensei. minha hipocondria mantinha uma prateleira inteira no guarda-roupa, peguei o remédio e parti pra casa dele.
meu cabelo molhado aliviava um pouco o calor no caminho pra estação, mas eu realmente não gostava de sair com o cabelo molhado. ele ficava com vontade própria e não tinha hora pior, 'bom, no elevador dele tem espelho e talvez dê pra dar uma ajeitada...' concluí sem muita esperança. 'vai ver que eu fico sexy meio descabelada' ri. abri o livro no momento em que o trem saiu, mas é claro que não consegui concentrar nele. pensei em rabiscar algo no moleskine que um amigo trouxe pra mim da europa, sempre estava na minha bolsa, mas eram tão lindas aquelas páginas brancas com a capa negra, o cheiro de novo. não tive coragem de novo. decidi pelo mp3 player, outro presente de aniversário (havia sido meu aniversário na sexta feira). ainda não tinha descoberto como fazer pra classificar as musicas por artista ou album, então estava ouvindo meio no shuffle mesmo.
fechei os olhos um pouco mareada da ressaca pela noite de ontem. só de lembrar do cheiro dos mojitos fiquei zonza. ok, zonza e enjoada. não almocei nada além de batatas fritas com molho shoyo e a barriga vazia não estava ajudando anyway. acho que o frontal não seria uma boa nessas condições, mas a idéia de me descontrolar, chorar e ficar incapaz de falar na frente dele era meio desesperadora.
'beleza, qual saída?', decidi que a 5 de julho ficava mais perto da pompeu loureiro que da barata ribeiro e subi as escadas. o tempo continuava quente, mas estava ventando daquele jeito que venta antes de chover. obviamente eu havia esquecido o guarda-chuva. na verdade, nem casaco eu peguei. meus passos eram meio pesados, não consegui saber se era por medo da conversa que teríamos ou porque meu estômago começava a roncar e minha pressão (que vive caindo nas horas mais propícias) a baixar.
'parada estratégica no supermercado', afinal, desmaiar tb não era boa idéia. bom, pelo menos não agora, talvez depois. talvez depois de despejar todas as minhas dúvidas em cima dele, depois dele me contar que realmente saiu com diversas mulheres desde que começamos a ficar juntos, depois d'eu bater nele e me sentir miserável. 'é, talvez depois disso desmaiar e não acordar mais seja uma boa idéia.'
peguei um pacote de ruffles, balas halls de melancia e um mate e sentei na pizzaria do mercado. já estava quase terminando qd o percebi.
ele era muito branco e tinha os olhos e cabelos escuros e despenteados. vestia calças jeans, allstar preto velho e uma camiseta escura meio desbotada. apesar disso, tinha um ar altivo e asseado, tive a impressão de q, se chegasse perto, sentiria um perfume muito bom. ele estava sentado a duas mesas de mim e desenhava num caderno de capa azul.

[ cap 1 ]

eu sentei no banco do metrô e liguei o mp3. se existem musicas perfeitas, eu não sei, mas existem musicas que, num perfeito momento, paralisam meu corpo. lembrei de uma época em que andava muito à noite e me permiti imergir num tempo tão passado e tão próximo. pensei que talvez pudesse escrever algo no meu caderno, ou desenhar um pouco, mas não consegui. minha vontade era ficar imóvel e permissivo àquelas sensações. não que tenha sido uma época boa.
uma formiga andou no meu braço. 'metrô tem formiga?' pensei. 'devia estar na minha mochila...'. o vagão estava praticamente vazio, era um domingo à tarde, bem no meio da tarde. quem estava na praia ainda não queria voltar e quem não saiu de casa, bem, não sairia agora. no banco à minha frente percebi uma saia de bolinhas. eram brancas num fundo negro e tinha uma bolsa branca em cima. da bolsa saíam dois fiozinhos brancos q findavam num fone de ouvido cor de rosa que a dona da saia estava colocando no ouvido. achei engraçado o fone cor de rosa e imaginei se o aparelho de mp3 seria rosa tb. ela tinha os olhos fechados e talvez estivesse ouvindo uma música num perfeito momento.
cabelos negros meio despenteados chegavam na altura no ombro, vestia uma blusa preta com um decote bonito. eu sempre admirei mulheres muito brancas, adorava apertar a pele delas e ver o tom avermelhado machucando aquela brancura. mas essa menina tinha a pele cor de café com leite fraco. como se alguém quisesse só colocar alguma corzinha num leite matinal. já os olhos eram grandes e pretos, como chocolate amargo, e agora olhavam pro outro lado do vagão. talvez ela tivesse percebido q eu estava olhando e resolveu olhar pra outro lado, talvez estivesse entediada.
chegamos à estação final, em copacabana. ela desceu primeiro, eu a segui. agora pude ver que ela tinha uma tatuagem nas costas q, de longe, parecia uma fada ou uma boneca, e outra na nuca, uma meia lua. me peguei pensando em outros lugares em q ela poderia ter tatuagens.
'she wants revenge' continuava a tocar no meu ouvido e, enquanto seguíamos o mesmo trajeto, eu a segui, cada vez mais de perto. na saída da estação, ela ficou confusa. olhou as placas, mas acabou se decidindo pela escada rolante da direita que saía na pompeu loureiro e eu, que pretendia ir pra casa, não resisti, estava curioso. queria ver ao menos pra onde ela ia.
se eu a visse na casa da matriz, talvez quisesse desenhá-la. ela parecia o tipo de menina que ia na matriz. talvez ela dançasse de um jeito bonito, balançando os cabelos, mexendo as mãos devagar. quis muito vê-la dançar. acho q foi pelo jeito q ela andava. ou pelos olhos de chocolate amargo. mas eu desejei encontrá-la num lugar em que uma abordagem minha não parecesse assustadora, ou meio maluca. 'hey, tô te seguindo desde o metrô, quer tomar algo comigo?', acho q não ia dar certo. talvez desse, sei lá. definitivamente não era meu estilo seguir mulheres desconhecidas na rua.